23.2.11

Coisas que gostaria de ter dito 13

Poderia ser um "Hard copy", mas o encanto da ingenuidade, do subentendido bacoco e da idiotice descomprometida merece não ser misturado com este caso sério de estupidez engajada. Um"anúncio" publicado no espaço público do sítio Ads of the World, fruto do esforço conjugado de um "designer" e de um "redactor". Artística, aqui, só a resposta do membro abaixo, que esgota, de forma contundente, expressiva e esclarecida tudo o que há a dizer sobre o assunto.

Hard copy 31

Ora aqui está um caso dúbio. Ou a ambiguidade é propositada, o que coloca este belo anúncio na categoria de bacanal comercial, com todo o desaforo de que só os brazucas são capazes (afinal, é de carnaval que se fala), ou então temos uma mensagem involuntariamente perversa, com um bodycopy tranquilizador, provando uma vez mais que a semântica é a mãe de todas as diferenças entre português de Portugal e português do Brasil.

14.2.11

Dia de lembrar

"You don't love someone for their looks, or their clothes, or their fancy car, but because they sing a song only you can hear."
Anónimo
Ilustração: Jon Klassen

11.2.11

Do tempo em que os anúncios falavam

Na sequência de algumas referências enviadas por A. andei a pesquisar para ver se encontrava bons exemplos de anúncios que traduzissem a ideia de arte mais estritamente associada a texto, embora pense que a “arte” do copy passa essencialmente pelo conceito, pelo humor e pela concisão. A mensagem escrita é cada vez mais escrava da concepção visual, em termos de relevância e de eficácia. A arte do design é, pela sua natureza, talvez mais fácil de isolar e de se sustentar autonomamente. No tempo de William Bernbach e na época áurea de David Abbott talvez a noção fosse diferente. Era-o, decididamente, no que à concisão diz respeito. Neste artigo, que por sua vez cita um outro dedicado a Abbott, a explicação para a mudança de paradigma é esta:
“The emphasis on television scripts, ambient media and several other factors has led to a decline of sorts in print advertising. By decline I mean the emphasis on copywriting as a craft. The print ads are a lot more visual led nowadays and sometimes don’t feature a single word. Nothing wrong if a copy-less ad communicated the idea.
What’s the big deal, you ask? The world is getting visual, people are constrained for time and advertising is an interruption. Who has the time to ready well-crafted advertising copy? Agreed, one needs to be telegraphic and grab the attention of the reader even faster today.”
Bill Bernbach e David Abbott foram talvez os criativos que mais se aproximaram do modelo idealizado de “copy artista”. Os conceitos que ajudaram a desenvolver para a Volkswagen e para o jornal The Economist, respectivamente, são os melhores exemplos da sua capacidade única de ensinar “art directors and copywriters everywhere [...] not to hide behind the wall of cynicism about clients' lack of understanding or appreciation”, e de que deverão colocar as sua próprias cabeças “about the parapet”. O trabalho destes homens pautou-se sempre pela inteligência subtil, “where the product was invariably king”, e consequente fuga ao gratuito. E se ainda hoje é destacado, tem necessariamente a ver com a humanidade com que o impregnaram, e pela sua tenaz defesa das "simple virtues".
Se esta linguagem pode eventualmente ser transgeracional, embora cada vez mais condensada, já não acredito que seja plausível em muitos mercados.
Alguns anúncios que fazem jus ao legado de Bernbach e Abbott:

The vassal's speech

It was never about status, membership, or self-seekingness. It was never about the freebies and perks, the partying and the booze. It was all about the work. About trying harder, learning, practicing, and perfecting. In the end, it was all about capability, and, yes, acceptance. I didn't make it to the ball. My vitriol never fit in and my trying never really resonated. But my gratitude is unscathed. I miss the guileless comradship, loyalty, and earnastness... I miss the fun. And will cherish my memories forever, with gratitude and the learning to go with it.
It was never about making my voice heard, but all about finding one. And that I did. So thank you. And good-fucking-bye.

10.2.11

David Fincher sobre The Social Network

"I hate the awards part of the moviemaking process," he continued. "And besides, on Social Network, I didn't really agree with the critics' praise. It interested me that Social Network was about friendships that dissolved through this thing that promised friendships, but I didn't think we were ripping the lid off anything. The movie is true to a time and a kind of person, but I was never trying to turn a mirror on a generation. 
[...]
Let's hope we strove to get at something interesting, but Social Network is not earth-shattering. Zodiac was about murders that changed America. After the Zodiac killings in California, the Summer of Love was over. Suddenly, there was no more weed or pussy. People were hog-tied and died. No one died during the creation of Facebook. By my estimation, the person who made out the worst in the creation of Facebook still made more than 30 million dollars. And no one was killed." 
Revista W, Fevereiro 2011 

A outra rede social

Na campanha pelo Oscar vale tudo. É bem sabido que hoje, mais do que nunca, os jogos de bastidores e a exposição pública engendrada pelos departamentos de marketing (muitas vezes num contexto alheio à promoção do filme que, já por si, é quase sempre excessiva) asseguram em grande parte as nomeações e, num sprint final de tirar olhos, determinam os vencedores. Apenas um exemplo: não foram nem a qualidade de The Blind Side nem os dotes interpretativos de Sandra Bullock nessa fita que lhe valeram o Oscar de Melhor Actriz no ano passado. O elemento afectivo jogou decisivamente junto dos membros votantes e uma série de muito bem calculadas presenças nos mais diversos eventos, cinematográficos ou não, encarregou-se de explorar o carisma e espontaneidade da actriz sem desgastar demasiado a sua imagem. Se Bullock tivesse estreado um filme no ano que passou, depois de todas as atribulações a nível pessoal que parecem ter reforçado o seu capital público de simpatia, com uma interpretação competente, ao nível da de The Blind Side, era certo que em 2011 tinha mais uma nomeação no bolso. Tão previsível quanto isto. E o que tem isto a ver com cinema?
Este ano, durante algum tempo pareceu que The Social Network detinha uma clara vantagem sobre The King's Speach. Um filme escorreito, técnica e artisticamente irrepreensível, com uma temática contemporânea e popular, era mais que certo que Network iria merecer louvores porventura exagerados – que o próprio David Fincher se encarregou de desmistificar – e epítetos tão entusiásticos quanto irrisórios, como “o filme de uma geração”. Não é, e isso dificilmente acontecerá por motivos óbvios. Será quando muito um óptimo filme da estação.
Uma das boas premissas de The Social Network é o distanciamento emocional em relação às figuras e ao universo retratados, a aparente ausência de juízos de valor e, inclusivamente, uma moralidade ambígua bem ao gosto, isso sim, de uma certa geração que enviesadamente caracteriza. O facto de o argumento de Aaron Sorkin se fundar essencialmente em conversas com Eduardo Severin, antes do desfecho da batalha legal que este moveu contra Mark Zuckerberg e o Facebook e dos milhões de dólares de compensação que o obrigaram a assinar uma cláusula de confidencialidade draconiana, parece suportar essa tese. Numa fase inicial, inclusivamente, argumentista, realizador e actores fizeram questão de sublinhar a ausência de pretensões “biográficas” e o carácter universal da história, referindo Jesse Eisenberg, por diversas vezes, que nunca interiorizou qualquer censura em relação à personagem que interpreta, preferindo inclusivamente não travar conhecimento com Zuckerberg de forma a não toldar o seu julgamento (ou ausência dele) sobre a criação de Sorkin.
E quando realidade e ficção não se deveriam cruzar na arena pública, em nome da honestidade de intenções e da integridade artística, eis que Eisenberg e Zuckerberg surgem juntos, há bem pouco tempo, no maior (e mais duradouro) expoente do humor satírico norte-americano, o programa Saturday Night Live. Ou seja, a traição de tudo o que o filme supostamente representava, num enquadramento ligeiro e descomprometido, entre gajos porreiros e todos muito amigos. A meu ver, e com este golpe publicitário, o filme perdeu a mística criada e, em certa medida, a razão de ser. E porquê o contrasenso? Ora deixa cá ver, estará relacionado com o facto de The King's Speech, promovido pela máquina comedora de Oscars que são os irmãos Weinstein, ter arrebatado uma série de prémios importantes, como o Directors Guild Awars e o Producers Guild Awards, neste final de época?
Não há obra que resista com a dignidade intacta à gula dos grandes estúdios. Pelas recompensas, simbólicas e materiais, pela popularidade a todo o custo e consequentes benefícios no chamado “ancillary market”. The Social Network passou de filme sincero pouco preocupado com as simpatias que iria recolher a postulado de cinismo empenhado em promover-se às custas, e com o beneplácito, do Facebook.
A transcrição do excerto de uma entrevista com David Fincher, que coloco no post seguinte, deixam perceber a antipatia do realizador por todo este processo, mas também denunciam algum afastamento em relação à presumível mensagem do filme.

9.2.11

Ilustração com todos

A minha irmã enviou-me isto, que é muito porreiro e vai direitinho para os meus marcadores de ilustração. Para além do interesse artístico oferece umas dicas bestiais e adequadas a toda a gente.
A sopa de miso, na qual nunca acertei, vai-se inspirar aqui para um próximo encontro comensal.
Para P. (temos de ter Nutella em nossa casa). OK, não é uma receita, mas vale pela lembrança.
Para S., por exemplo, olha tão bom, tudo refogadinho...
Para D., para ver se cortas no açúcar refinado sem cortar nas guloseimas.
Para mim e para todos os agarrados ao amido.
Muito boa ideia. Gracias, hermana.

Hard copy 30

... E por falar em fervor, este anúncio lembra-me qualquer coisa. Não tenho nenhuma categoria para "worst appetite appeal ever", classificando à marketer, por isso terá de ficar nesta. Se isto não é anterior a 1973, ou o director criativo e o cliente viviam juntos debaixo de uma rocha ou tinham um desopilante sentido de humor.

A Salvação está na maçã

A Igreja Católica nos Estados Unidos deu a sua bênção a uma aplicação para o iPhone destinada a “preparar os católicos para a confissão”. Um guia para todos os penitentes que usaram Windows durante décadas e que agora se vão iluminar no confessionário com o esplendor do iOS: “Oh Lord, 4G is Thy Name!”. Sim, parece que é para uso no confessionário, mas na notícia garantem que “não é substituto para um padre”. Não devem tardar aplicações criadas para orientar os fiéis em plena eucaristia (como não colar a hóstia ao céu da boca, por exemplo) e em situação de pecado venal: “Que fazer quando uma demoníaca internet tablet com plataforma Android desafia o patriarcado do meu iPad?”. Não temas, irmão, a Mac App Store guiará o teu caminho!

7.2.11

Coisas que gostaria de ter dito 12


(Mas que nunca diria...)

"And I went through this whole thing: am I gay? Am I straight?! And I realized: I'm just slutty."

Margaret Cho

Talento incógnito


Este trabalho, encontrado aqui, explora a poesia do quotidiano com fantasia e humor, num traço conciso e realmente único. A artista dá pelo nome de Smlpptt.

Wonderfully concise exercises in everyday poetry, characterisation, fantasy and wit. I came across this pretty unique work here. The artist goes by the name of Smlpptt.

Outras receitas

Uma peça gira assinada por Violeta Lópiz. Escolha inesperada para uma área de actividade que tanto precisa de humanização. Imagens em série de casais idosos em júbilo com a bexiga solta, quarentões que reencontraram a virilidade em lençóis de cetim e pré-mamãs vestidas de branco em fundo asséptico não contam.

1.2.11

Fazer História

Parece estar a acontecer que, em muitas vidas cheias de já chega, é chegado o momento de fazer realmente alguma coisa.

Ilustração: Justin Cooper

É do caneco*



Desse gigantesco conglomerado de glutamato monossódico que nos deu a Royco Cup-a-Soup - ocasionando a rara e consensual rejeição pública de uma coisa má, prova de que os portugueses engolem pior uma sopa de pacote do que décadas de governação cleptocrática e espoliadora - saem palavras pertinentes via um CEO lavadinho de sorriso ligeiramente enviesado. E antes de se pensar que ele está a falar de outra empresa qualquer, tipo um negócio de horticultura montado nas horas vagas, atente-se no pormenor: "We just need to get sustainability into our design and business model from the beginning". Ou seja, "só precisamos" (assim como Portugal "só precisa" de aumentar o PIB e de reduzir a dívida externa) de cortar nas embalagens de plástico radioactivo e de alterar micro-estruturalmente o modelo de negócio 30 vezes antes de chegarmos à conclusão de que precisamos é de o extinguir. Estes gajos que limpam o rabo à sustentabilidade em papel extra-branqueado de folha tripla é que nos vão ensinar como é. Aí fica um elenco selecto de produtos Unilever, para que ninguém duvide de tão boas intenções.

*Slogan da campanha de lançamento da Royco Cup-a-Soup em Portugal.

Arquivo do blogue